O novo livro de Martha Galrão, uma carta bahiana bem bonita:
A minha avó
Mariazinha era uma cabocla bem magrinha. Com os óculos na cabeça, ela
perguntava: onde estão meus óculos, você viu?
Ela tinha uma
parreira no quintal e fazia saquinhos de pano para proteger as uvas dos
passarinhos.
Seu nome de
batismo era Maria Salomé. Gostava de medicar as pessoas, uma vez pingou remédio
pra ouvido nos olhos de alguém. E deu certo.
Católica
convicta, ficou doida atrás de seu Santo Antônio, uma miniatura marrom. Achou
no quarto de Lito, perfilado entre os soldados em guerra no Forte Apache.
Em um dos quartos
da grande casa, tinha um nicho lindo, com muitos santos e velas. Lá, rezava
todas as noites, pedindo que nada faltasse aos filhos, mas que nunca ficassem
ricos. Era tão amiga dos santos, que até hoje nem um bisneto conseguiu
enriquecer...
Brigou com Zé
Fernando, meu primo, porque chupava um picolé em dia de chuva, mas emendou na
mesma frase: "Com um frio desse, menino! Me dá um pedaço ...."
A minha vó
trabalhava no correio da cidade de Ubaíra. Eu ficava fascinada com tanta
correspondência. Não tenho palavras pra descrever essa emoção de estar no
correio onde minha avó trabalhava, na intimidade de quem toca todas as cartas.
A minha avó
Mariazinha queria que eu fosse uma boa menina. Ainda sofro até hoje por não
saber ser assim tão boazinha. O meu pai sempre falava: dona Mariazinha era uma
santa!
Eu enjoada,
vomitando a alma, deitada no colo da minha avó. A minha avó fazendo o sinal da
cruz onde afligia e dizendo: Nossa Senhora passou por aqui com seu cavalinho
comendo capim.
Martha Galrão (Brasil - Bahia)
Um comentário:
Obrigada!
Kandandu,
Martha
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