20 de outubro de 2010

TIMIDEZ


Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...

- mas só esse eu não farei.

Uma palavra calda
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...

- palavra que não direi.

Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,

- que amargamente inventei.

E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...

- e um dia me acabarei.

Cecília Meireles (Brasil)

12 de outubro de 2010

NOBEL DA PAZ 2010 - LIU XIAO BO




"The Norwegian Nobel Committee has decided to award the Nobel Peace Prize for 2010 to Liu Xiaobo for his long and non-violent struggle for fundamental human rights in China. The Norwegian Nobel Committee has long believed that there is a close connection between human rights and peace. Such rights are a prerequisite for the 'fraternity between nations' of which Alfred Nobel wrote in his will."
http://www.reuters.com/article/idUSTRE6971XZ20101008

One Letter Is Enough


for Xia

one letter is enough
for me to transcend and face
you to speak

as the wind blows past
the night
uses its own blood
to write a secret verse
that reminds me each
word is the last word

the ice in your body
melts into a myth of fire
in the eyes of the executioner
fury turns to stone

two sets of iron rails
unexpectedly overlap
moths flap toward lamp
light, an eternal sign
that traces your shadow

8. 1. 2000
Liu Xiao Bo (China)


Traduzido para ingles por Jeffery Yang 

5 de outubro de 2010

YOUR FANTASY


I need a wake up call from what life can really be,
I need a call from reality.
Look me deep in the eyes and it’s easy to see,
A distant world reflecting me.

I can’t help but wonder why,
I should feel the need to cry.
Time passes oh so slowly by,
Am I being consumed by, lies?

I’m a myth,
Not a story,
I’m a fairytale with a different twist.
I’m fantasy, not your ordinary.

I dream with reality,
I see a world of lies,
With stereotypes,
And no originality.
Reality,
He dreams with me,
I’m everything,
He wants to be.

Мαяϊα:; (Portugal)
Nasceu em Portugal em 1995, vive em Inglaterra desde os 5 anos.
http://writingisyourfreedom.blogspot.com/ 

29 de setembro de 2010

Blog da Semana - 14/2010

Depois de uma semana longa, mesmo muito longa, Cores  & Palavras volta a publicar o Blog da Semana. Depois do Brasil, na semana 13, voltamos a Angola e a escolha recai em http://literaturafragatademorais.blogspot.com/ (Fragata de Morais), aconselho vivamente.


Bailarinos kiokos, Lundas. Foto retirada do blog Fragata de Morais


PROVÉRBIOS E ADIVINHAS DE ANGOLA

Adivinhas e provérbios são propostos à noite, nas conversas colectivas, como forma de transmissão oral do conhecimento. Nunca de dia.




Uma adivinha umbundu:

Ekamba lyange liluka ngo, onjokasyasya.

(o meu amigo anda sempre a mudar e nunca larga a casa).

De que amigo se trata? O caracol


Um provérbio kikongo:

Kunda kia mfumu, keki fonguanga kua wantu wole ko.

(Na cadeira do chefe não se sentam duas individualidades)

20 de setembro de 2010

INVICTUS



"Invictus" é um poema escrito em 1875 pelo poeta inglês William Ernest Henley (1849–1903). Foi publicado pela primeira vez em 1888 no “Livro de Versos” (Book of Verses).



O poema, amplamente citado no filme Invictus, foi uma inesgotável fonte de inspiração e apoio moral para Nelson Mandela durante o período em que esteve cativo nas prisões do regime racista do Apartheid.
O autor, William E. Henley, escreveu-o numa cama de hospital, depois de lhe terem amputado uma perna.





INVICTUS


Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul. –

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed. –

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find me, unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate;
I am the captain of my soul.

William Ernest Henley (Inglaterra)
 
INVICTUS
 
Parar além desta noite que me cobre,
Negra como poço fundo e profundo
Agradeço aos deuses – caso eles existam,
Por esta minha alma invencível.

Nas cruéis engrenagens do destino
Jamais vacilei ou me lamentei chorando.
Submetido aos golpes certeiros do acaso
Trago minha cabeça - ainda sangrando - mas erguida.

Para além da ira e das lágrimas deste lugar
Só o espectro do Horror da sombra se divisa;
Apesar da ameaça do fluir dos anos
O tempo encontra-me e encontrar-me-á sem medo.

Não importa a estreiteza do portão,
Nem o pergaminho das pesadas sentenças,
Sou o mestre e senhor do meu destino;
Eu sou o capitão da minha alma.

Tradutor: Namibiano Ferreira

8 de setembro de 2010

OS LIVROS QUE LI NAS FÉRIAS

Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil
Leandro Narloch
LeYa



Escrito para qualquer um ler e ficar informado. O autor faz acompanhar o livro por uma extensa bibliografia, o que lhe dá um crédito favorável e positivo, para quem tiver tempo para verificar a veracidade dos assuntos tratados.
Alguns dos temas abordados neste livro trazem factos novos, desconhecidos e polémicos, por exemplo:
Zumbi, no seu quilombo, tinha escravos.

Machado de Assis, antes de se tornar escritor de renome, foi crítico de literatura e teatro nos jornais. O governo de D. Pedro II o contratou para chefiar a censura às peças de teatro.

José de Alencar pronunciou-se repetidas vezes contra o fim da escravidão, chegando a escrever cartas ao Imperador sobre isso.

O jovem Jorge Amado escreveu textos elogiando Stalin, o que não surpreende, dado que ele era comunista, mas também elogiando Hitler!

Gilberto Freire (autor de Casa Grande & Senzala) admirava a Ku Klux Klan. A sua dissertação de mestrado nos EUA em 1922 contém elogios à confraria racista. Ao republicá-la em 1964 ele expurgou esses trechos.

 
O Vendedor de Passados
José Eduardo Agualusa
Publicações D. Quixote

Um exerto do livro: Nasci nesta casa e criei-me nela. Nunca saí. Ao entardecer encosto o corpo contra o cristal das janelas e contemplo o céu. Gosto de ver as labaredas altas, as nuvens a galope, e sobre elas os anjos, legiões deles, sacudindo as fagulhas dos cabelos, agitando as largas asas em chamas. (...) A semana passada Félix Ventura chegou mais cedo e surpreendeu-me a rir enquanto lá fora, no azul revolto, uma nuvem enorme corria em círculos, como um cão, tentando apagar o fogo que lhe abrasava a cauda.
“Ai, não posso crer! Tu ris?!”
Irritou-me o assombro da criatura. Senti medo mas não movi um músculo.

 
 
A Governanta - D. Maria, Companheira de Salazar
Joaquim Vieira
Esfera dos Livros

Vendo chegar a viatura oficial com o porta-bagagem carregado de lenha, o chefe do Governo gritou irado à sua governanta: «Os carros do Estado não são para carregar lenha! Não consinto!». A mulher não se ficou e gritou no mesmo tom: «Merda! A lenha não é para mim, é para o Salazar!» Quem se atreveu a gritar assim a António de Oliveira Salazar, homem temido e respeitado por todos, foi Maria de Jesus Caetano Freire, a sua dedicada e fiel companheira ao longo de toda uma vida. Nascida no seio de uma pobre família camponesa no lugar de Freixiosa da freguesia de Santa Eufémia, no concelho de Penela, distrito de Coimbra, aos 31 anos começou a servir os então lentes universitários e amigos Manuel Gonçalves Cerejeira e António de Oliveira Salazar. Seguiu este último para Lisboa (ao mesmo tempo que o primeiro subia ao lugar mais alto da hierarquia católica em Portugal) e só o abandonou quando, aos 81 anos, o ditador morreu por doença. Maria de Jesus tinha cumprido a missão da sua vida. Nunca casou, nem teve filhos. Mulher dura, forte, atenta, de uma dedicação canina, foi intendente, organizadora das lides domésticas, secretária, companheira, portadora de recados e pedidos, informadora de murmúrios e opiniões que mais ninguém se atrevia a expressar, conselheira e até enfermeira, nos seus últimos tempos de vida, do fundador e líder do Estado Novo. D. Maria foi tudo isto, e por isso merece um lugar de destaque na História do século XX português.

 
 
Imitação de Sartre & Simone de Beauvoir
João Melo
Ed. Caminho
Usando as palavras de Agualusa: Este livro “reúne dez estórias de gente comum, estórias de gente que se encontra e, sobretudo, se desencontra, a maior parte das vezes em confronto com a realidade que de repente deixou para eles de fazer sentido. (...)João Melo recorre a artifícios vários, ora introduzindo elementos de surpresa (...) ora convidando o leitor a escolher entre diferentes termos ou percursos, num constante jogo de sedução. Consegue com isso um ritmo espantoso, quase cinematográfico.

7 de setembro de 2010

OBRIGADO, POETA!

Estava de férias quando Ruy Duarte de Carvalho faleceu, aqui fica a minha homenagem a um poeta angolano do Namibe, embora natural de Santarém, Portugal. Chegou a Angola ainda bebé e ficou filho da terra que amou até á morte... Obrigado, POETA!




Ruy Duarte de Carvalho


CHAGAS DE SALITRE


Olha-me este país a esboroar-se
em chagas de salitre
e os muros, negros, dos fortes
roídos pelo vegetar
da urina e do suor
da carne virgem mandada
cavar glórias e grandeza
do outro lado do mar.

Olha-me a história de um país perdido:
marés vazantes de gente amordaçada,
a ingénua tolerância aproveitada
em carne. Pergunta ao mar,
que é manso e afaga ainda
a mesma velha costa erosionada.

Olha-me as brutas construções quadradas:
embarcadouros, depósitos de gente.
Olha-me os rios renovados de cadáveres,
os rios turvos do espesso deslizar
dos braços e das mães do meu país.

Olha-me as igrejas restaudadas
sobre ruínas de propalada fé:
paredes brancas de um urgente brio
escondendo ferros de educar gentio.

Olha-me a noite herdada, nestes olhos
de um povo condenado a amassar-te o pão.

Olha-me amor, atenta podes ver
uma história de pedra a construir-se
sobre uma história morta a esboroar-se
em chagas de salitre.

Ruy Duarte de Carvalho (Angola) 1941 - 2010

3 de agosto de 2010

Blog da Semana - 13/2010

Foto Liane Neves (Blog Quintana Eterno)


Depois de uma semana muito longa, estou de volta com um novo Blog da Semana, uma homenagem a um grande poeta brasileiro, Mário Quintana, porfavor visitem: 




Texto retirado na íntegra do blog referido:

REFLEXÕES DO CADERNO H

Selecionei alguns textos que Quintana publicou no CADERNO H . Cada um deles nos leva a viajar por muitas reflexões. Boa viagem.



COISAS DO TEMPO


Com o tempo, não vamos ficando sozinhos apenas pelos que se foram: vamos ficando sozinhos uns dos outros.


CUIDADO!


A nossa própria alma apanha-nos em flagrante nos espelhos que olhamos sem querer.


TENHO PENA DA MORTE


Tenho pena da morte – cadela faminta – a que deixamos a carne doente e finalmente os ossos, miseráveis que somos... O resto é indevorável


MAS TUDO É NOVO DEBAIXO DO SOL


Resmungam os velhos – “Não há nada de novo debaixo do sol” – e nem se lembram dos que, neste momento, estão recriando o mundo: os poetas, as artistas, os recém-nascidos.


DA SAUDADE


A saudade que dói mais fundo – e irremediavelmente – é a saudade que temos de nós.


DO CONHECIMENTO


Tudo já está nas enciclopédias e todas dizem as mesmas coisas. Nenhuma delas nos podem dar uma visão inédita do mundo. Por isso é que leio os poetas. Só com os poetas se pode aprender algo novo.


NADA SOBROU


As pessoas sem imaginação podem ter tido as mais imprevistas aventuras, podem ter visitado as terras mais estranhas...Nada lhes ficou. Nada lhes sobrou. Uma vida não basta apenas ser vivida: também precisa ser sonhada.


Mario Quintana in: CADERNO H

COMBOIO MALANDRO

António Jacinto, poeta angolano.

O comboio malandro passa
passa sempre c'oa força dele
u-u hi-hi te-que-tem te-que-tem
nas janelas muita gente
ah boa viagée adeus homée
n'ganas bonitas
quintandeiras de lenço encarnado
levam cana no Luanda p'ra vender
u-u hi-hi
aquele vagon de grades tem bois
mu mu mu
tem outro igual
como este dos bois
leva gente muita gente como eu
cheio de poeira
gente triste como os bois
gente que vai no contrato


tem bois que morre no viagée
mas preto não morre
canta como é criança
mulondé iakessoa!
uadibalée uadibalée uadibalée
esse comboio malandro
sozinho na estrada de ferro passa
passa sem respeito
u-u hi-hi
com muito fumo no trás
tem-que-tem tem-que-tem


Comboio malandro
o fogo que sai no corpo dele
vai no capim e queima
vai nas casas dos preto e queima
esse comboio malandro
já queimou meu milho


Se na lavra do milho
tem pacaças
eu faço armadilha no chão
se na lavra tem Kiombos
eu tiro espingarda de Kimbundo
e mato neles!


Mas se vai lá fogo
de comboio malandro deixa
só fica fumo
muito fumo mesmo...


Mas espera só
quando esse comboio malandro descarrilar
e os branco chamar os preto
p'ra empurrar
eu vou... mas não empurro


Nem com o chicote
finjo só que faço força
comboio malandro
você vai ver só o castigo
vai dormir mesmo no meio do caminho!


António Jacinto (Angola)




ANTÓNIO JACINTO
(1924-1991)
António Jacinto, cujo nome completo é António Jacinto do Amaral Martins, nasceu em Luanda em 1924 e faleceu em 1991. Orlando Távora é o pseudónimo utilizado por António Jacinto como contista.
Por razões políticas esteve preso entre 1960 e 1972. Militante do MPLA, foi co-fundador da União de Escritores Angolanos, membro do Movimento de Novos Intelectuais de Angola e participou activamente na vida política e cultural angolana. Foi empregado de escritório e técnico de contabilidade, Ministro da Educação de Angola e Secretário de Estado da Cultura.
Obra poética: Poemas, 1961; Outra vez Vovô Bartolomeu , 1979; Sobreviver em Tarrafal de Santiago, 1985

5 de julho de 2010

Blog da Semana - 12/2010

O blog da semana 12 é angolano. Trata-se do blog do poeta João Tala. Um poeta já com obra publicada há alguns anos. Recentemente trouxe a público o seu mais recente poemário, "Forno Feminino".
Visitem o poeta em: http://blogtala.blogspot.com/

SOBRE FORNO FEMININO



EXPLICO EM NOTA PRELIMINAR QUE FORNO FEMININO É UMA ESCULTURA MOLDADA DE BARRO COM CONTORNOS Á IMAGEM DE UMA MULHER CUJO  VENTRE SE ABRE UMA CAVIDADE

Foto: blogtala74



trompas uterinas/braços do mundo
ouço o recomeço acostumada seara
de grãos rompidos
ainda. as grandes mãos do mundo
fixam sementes, algarismos
palavras cervicais
húmus sobre terra húmida,
é esse o caminho que atinge ovários
pela boca da labareda.

João Tala (Angola)
In Forno Feminino

24 de junho de 2010

Blog da Semana - 11/2010

Recalcitrante é o blog da semana. O Blog da Meg como eu carinhosamente chamo. Nao vos aconselho a visitá-lo, eu OBRIGO-VOS democraticamente a visitá-lo e nao digo mais nada!


José Pádua (foto Recalcitrante)

O SILÊNCIO DAS GENTES


Um silêncio e passos d’homens importantes
Ecoam chão de mosaicos
Poc, poc, poc…ecos
E fatos enfatados
E engravatados
D’homens importantes que as gentes!

Um microfone num discurso sábio
Regado de palavras sábias
O silêncio cúmplice dos dias
No silêncio do silêncio
Das gentes cansadas das oratórias
E discursos de hipocrisias!

Uma torrente de palavras rechonchudas
Um desfile de sapiência
Em gravatas abastadas
As minhas gentes caminham mudas
E desesperam paciência
Na dor do alvorecer de madrugadas!

Quem compra os espinhos das gentes
No suor da caminhada?
Passos d’homens arrogantes
Ecoam mosaico d’estrelas
Eu rezo as velas
Das gentes perfiladas nas estradas!

As minhas gentes suam injustiça dos dias
E dor das noites silenciadas
Magricelas
No palácio das estrelas
Gravatas abastadas
Festejam hipocrisia de palavras sábias!

A minha noite adormece entristecida
Na cobardia da gente emudecida!

Décio Bettencourt Mateus (Angola)

In "Xé Candongueiro

23 de junho de 2010

XÉ CANDONGUEIRO

Poema vivo, vivo e cheio dos barulhos-povo de uma cidade frenética de VIDA, vida e dificuldades... Este poema é, para além do poema escrito, um outro poema "escrito-música", unicamente SOM. Uma sonoridade que de uma forma magistral foi poeticamente representada através da palavra escrita. Quem nao conseguir SENTIR-OUVIR e PRESSENTIR isto nao inspira a totalidade deste poema, a sua ALMA!

Namibiano Ferreira


Candongueiros


XÉ CANDONGUEIRO
 
Candongueiro tem pressa

Sobe na baúca
Não tem conversa
Condução louca
Pé no acelerador, velocidade
Não respeita prioridade!
Eh! Candongueiro dono da estrada
Ultrapassa pela direita
Manobra arrojada
Ultrapassa
Vuza na estrada estreita
“Trabalha não dá confiança”, tem pressa!

Candongueiro abarrotado
Não afrouxa na lomba
Leva gente p’ra mutamba
Pé no acelerador, velocidade
Dono da cidade
“Dinheiro trocado, dinheiro trocado!”

Eh! Candongueiro tem cobrador
Que grita: 1. de Maio, Maianga, Maianga…
Pé no acelerador, zunga-que-zunga
Abarrotado de gente
Não respeita cliente:
“Ou encosta ou desce meu senhor!”

Zé Pirão, São Paulo, Roque
“Não há maka emagrece meu kota”
Candongueiro manda na estrada
Leva gente do musseque
Gente enlatada
Roda batida é dono da rota!

“Trabalha não dá confiança”
Prenda, Mulembeira, Mulembeira
Leva gente do povo gente da praça
Candongueiro transporte do povo
Não é carro novo
Arranca levanta poeira!

Zunga-que-zunga sobe o passeio
Carro cheio
Xé candongueiro
Respeita passageiro
E espera prioridade
Candongueiro é dono da cidade!

Eh! Candongueiro é gente importante
No carro velho
Leva gente p’ro trabalho
Carrega gente descarrega gente
Ku Duro música alta
Xé candongueiro olha multa!

Décio Bettencourt Mateus (Angola)

In Xé Candongueiro!

Xé: atenção !, cuidado !

Candongueiro: espécie de mini-autocarros – normalmente Toyota Hiace ou Comuter, azul e brancos – que se dedicam ao transporte de pessoas.
Baúca: espaço adjacente à parte de trás dos bancos da frente, i.e. do motorista e outros.
Emagrece: em linguagem popular do candongueiro quer dizer que o cliente deve encostar-se o máximo que puder, para que outro cliente possa sentar-se.
Ku duro: estilo musical made in Angola, em moda.
Kota: mais velho, pessoa de respeito.

http://mulembeira.blogspot.com/

22 de junho de 2010

CREDO - CARLOS MEJIA GODOY





Creo señor firmemente que de tu pródiga mente todo este mundo nació,

que de tu mano de artista, de pintor primitivista, la belleza floreció.
las estrellas y la luna, las casitas las lagunas,
los barquitos navegando sobre el río rumbo al mar,
los inmensos los cafetales, los blancos algodonales
y los bosques mutilados por el hacha criminal,
los inmensos los cafetales, los blancos algodonales
y los bosques mutilados por el hacha criminal.

Creo en vos, arquitecto, ingeniero,
artesano, carpintero, albañil y armador,
creo en vos, constructor de pensamiento,
de la música y el viento, de la paz y del amor.

Yo creo en vos Cristo obrero, luz de luz y verdadero unigénito de Dios,
que para salvar al mundo en el vientre humilde y puro de María se encarnó.
Creo que fuiste golpeado, con escarnio torturado,
en la cruz martirizado siendo Pilatos pretor,
el romano imperialista, puñetero y desalmado,
que lavándose las manos quiso borrar el error,
el romano imperialista, puñetero y desalmado,
que lavándose las manos quiso borrar el error.

Creo en vos, ...

Yo creo en vos compañero, Cristo humano, Cristo obrero, de la muerte vencedor.
Con tu sacrificio inmenso engendraste al hombre nuevo para la liberación.

Vos estás resucitando en cada brazo se alza
para defender al pueblo del dominio explotador.

Porque estás vivo en el rancho, en la fábrica, en la escuela,
creo en tu lucha sin tregua creo en tu resurrección,
porque estás...

Creo en vos...

Yo creo en vos, Cristo obrero
luz de luz y verdadero
unigénito de Dios que para salvar el mundo
en el vientre humilde y puro de María se encarnó.

Creo que fuiste golpeado
con escarnio torturado
en la cruz martirizado
siendo Pilatos pretor.

El romano imperialista
traicionero y desalmado
que lavándose las manos
quiso borrar su error.

Creo en vos arquitecto, ingeniero,
artesano, carpintero, albañil y armador;
creo en vos constructor del pensamiento,
de la música y el viento, de la paz y el amor.

Yo creo en vos compañero,
Cristo humano, Cristo obrero
de la muerte vencedor con el sacrificio inmenso
engendraste al hombre nuevo para la liberación.

Dios está resucitando
en cada brazo que se alza
para defender al pueblo
del demonio explotador.

Porque estás vivo en el rancho,
en la fábrica, en la escuela;
creo en tu lucha sin tregua
creo en tu resurrección;
Porque estás vivo en el rancho,
en la fábrica, en la escuela;
creo en tu lucha sin tregua
creo en tu resurrección.

Creo en vos arquitecto, ingeniero,
artesano, carpintero, albañil y armador;
creo en vos constructor del pensamiento,
de la música y el viento, de la paz y el amor.

 
Carlos Mejía Godoy (Nicarágua)

Créditos: http://sensacionesmusicales.blogspot.com/2008/03/carlos-mejia-godoy-credo.html

20 de junho de 2010

POEMA DE JOSÉ SARAMAGO

José Saramago - Nobel da Literatura 1998


Fala do velho do restelo ao astronauta


Aqui, na Terra, a fome continua,
A miséria, o luto, e outra vez a fome.

Acendemos cigarros em fogos de napalme
E dizemos amor sem saber o que seja.
Mas fizemos de ti a prova da riqueza,
E também da pobreza, e da fome outra vez.
E pusemos em ti sei lá bem que desejo
De mais alto que nós, e melhor e mais puro.

No jornal, de olhos tensos, soletramos
As vertigens do espaço e maravilhas:
Oceanos salgados que circundam
Ilhas mortas de sede, onde não chove.

Mas o mundo, astronauta, é boa mesa
Onde come, brincando, só a fome,
Só a fome, astronauta, só a fome,
E são brinquedos as bombas de napalme.


(In OS POEMAS POSSÍVEIS, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1981. 3ª edição)

JOSÉ SARAMAGO (Portugal, 1922 - 2010)

17 de junho de 2010

TSIETSI MASHININI - UM HERÓI

Tsietsi Mashinini







Só é pena estar em alemao...

Se tiverem oportunidade visitem o site da Cirandeira, ela fez uma postagem para comemorar a Revolta do Soweto de 1976: http://giramundo-cirandeira.blogspot.com/2010/06/africa-do-sul.html#comment-form

Teboho "Tsietsi" MacDonald Mashinini (born January 27, 1957 in Central Western Jabavu, Soweto, South Africa, died summer, 1990 in Conakry, Guinea) was the primary student leader of the Soweto Uprising that began in Soweto and spread across South Africa in June, 1976.

Mashinini was a bright, popular and successful student at Morris Isaacson High School in Soweto where he was the head of the debate team and president of the Methodist Youth Guild.
A move by South Africa's apartheid government to make the white, colonial language Afrikaans an equal mandatory language of education for all South Africans in conjunction with English was extremely unpopular with black, Bantu and English-speaking South African students.
A student himself, Mashinini planned a mass demonstration by students for June 16, 1976. This demonstration which would become known as the Soweto Uprising lasted for three days during which several hundred people were killed, the majority of them black students.
Having been identified as the leader of the uprising by the South African government, Mashinini fled South Africa in exile, first to London then later to various other African countries, including Liberia where he was briefly married to Miss Liberia 1977, Welma Campbell.
He died under mysterious circumstances, possibly of AIDS, possibly of homicide, in the summer of 1990 while in exile in Guinea. His body was repatriated to South Africa on August 4, 1990 where he was interred in Avalon Cemetery. His grave bears the epitaph "Black Power."

(Biografia retirada de Wikipedia)
 
 
 
Se tiverem a oportunidade aconselho este livro, A Burning Hunger - One Family's Struggle Against Apartheid. Nao sei se existe traducao em portugues, mas é um excelento livro escrito pela americana Linda Schuster. A Burning Hunger conta a história dos Mashinini, da Revolta do Soweto e claro está do próprio regime racista do Apartheid.

16 de junho de 2010

Blog da Semana - 10 - 2010

O blog escolhido para a semana 10 é a KITANDA, http://kotodianguako.blogspot.com/  que vivamente aconselho, há frutas gostosas por lá...
Tela de Thó Simoes (Angola)


amar é mesmo assim

ela tem uma ave nos contornos de mulher
e me vê com as escleróticas em fuga.
deixa-se ir ao tempo com um corpo de navio
enche a embala com o seu todo.
ela emergiu da “casa inabalável”
e victoriosa depôs o soba.
rendo-me à vassalagem quero-a solta e rica.
certo ou incerto os sonhos errados
tornam-se vivos: como um compêndio de
mil escrituras no amor que gesticulo.

João Tala (Angola)

15 de junho de 2010

CESÁRIA ÉVORA - CABO VERDE

Cesária Évora, a Diva da música caboverdiana.


11 de junho de 2010

VIVA O MUNDIAL E UM PENSAMENTO PARA O MADIBA





É dia da grande festa do futebol, no entando há dor. Nelson Mandela perdeu mais um dos seus ente queridos em acidente de viaccao. Neste momento as minhas sinceras condolencias ao Madiba.

8 de junho de 2010

O CORACAO MILITANTE DE JACINTA PASSOS

Mulher, feminista, comunista, separada do marido, empobrecida, louca. Muitos foram os estigmas que Jacinta Passos enfrentou. Sua trajetória de vida absolutamente singular, bem como sua fidelidade às ideias e valores que elegeu, levaram-na a chocar-se diuturnamente contra tudo e todos, na contramão do tempo. Seus embates foram duríssimos. Não fugiu a nenhum. Ao contrário, parece que os buscou. Pagou um preço pessoal muito alto pelas escolhas que fez. Jamais se apresentou como vítima. Caneta e lança na mão, escudo de ferro no peito, foi como guerreira que se apresentou, lutando até o último dia de vida contra muitos, inclusive contra uma parte de si mesma. Venceu, foi derrotada e recomeçou várias vezes, sem nunca ter perdido de todo a ternura, como aconselhava Che Guevara – o Che da Revolução Cubana que ela tanto admirou –, pois foi poeta até morrer.



Jacinta Passos *


Este é o primeiro parágrafo da biografia de minha mãe que escrevi, e que consta do livro Jacinta Passos, coração militante, que será lançado no dia 8 de junho, terça-feira próxima, no Espaço Unibanco de Cinema Gláuber Rocha, na Praça Castro Alves, Salvador, de 18 às 21 horas. O volume reúne a obra completa em verso e prosa de Jacinta, inclusive inéditos, sua fortuna crítica e ensaios escritos especialmente para a edição. Em breve, o livro, que é uma coedição da Corrupio e da Edufba, estará nas livrarias do país, inclusive nas virtuais. A partir da próxima semana, já poderá ser comprado pelo site da Edufba.


*Inagen: Jacinta Passos, década de 1930.

Postagem retirada na íntegra do blog: http://enredosetramas.blogspot.com/

1 de junho de 2010

Blog da Semana - 09-2010

Trago-vos hoje, para o Blog da Semana e pela primeira vez, um blog nao lusófono mas pertinho da nossa lusofonia, de habla castellana. Trata-se do blog argentino: Lisarda Baila Cumbia (http://lisarda.blogspot.com/)

Foto do blog Lisarda Baila Cumbia


Borges, Oda escrita en 1966

Nadie es la patria. Ni siquiera el jinete

Que, alto en el alba de una plaza desierta,
Rige un corcel de bronce por el tiempo,
Ni los otros que miran desde el mármol,
Ni los que prodigaron su bélica ceniza
Por los campos de América
O dejaron un verso o una hazaña
O la memoria de una vida cabal
En el justo ejercicio de los días.
Nadie es la patria. Ni siquiera los símbolos.


Nadie es la patria. Ni siquiera el tiempo
Cargado de batallas, de espadas y de éxodos
Y de la lenta población de regiones
Que lindan con la aurora y el ocaso,
Y de rostros que van envejeciendo
En los espejos que se empañan
Y de sufridas agonías anónimas
Que duran hasta el alba
Y de la telaraña de la lluvia
Sobre negros jardines.


La patria, amigos, es un acto perpetuo
Como el perpetuo mundo. (si el Eterno
Espectador dejara de soñarnos
Un solo instante, nos fulminaría,
Blanco y Negro relámpago, Su olvido.)


Nadie es la patria. Pero todos debemos
Ser dignos del antiguo juramento
Que prestaron aquellos caballeros
De ser lo que ignoraban, argentinos,
De ser lo que serían por el hecho
De haber jurado en esa vieja casa.
Somos el porvenir de esos varones
La justificación de aquellos muertos;
Nuestro deber es la gloriosa carga
Que a nuestra sombra legan esas sombras
Que debemos salvar.
Nadie es la patria, pero todos los somos.
Arda en mi pecho y en el vuestro, incesante,
Ese límpido fuego misterioso.

José Luís Borges (Argentina)

28 de maio de 2010

LÍNGUA: SABOR & SABEDORIA

Uma representacao de Oxalá


Fotos e texto extraídos do blog Cirandeira*



Oxalá é considerado como o criador do mundo, embora diga-se também, que na hora de fazê-lo tenha bebido demais de um certo vinho de palma, passando o encargo, então, a Odudua.
A mitologia africana tem isto de belo: possui sempre variantes de um mesmo mito - o que, longe de confundir, apenas enriquece as possibilidades de compreensão do mundo.
Neste mito que começamos a contar agora, vemos Oxalá na condição de regente do mundo. Como um bom deus da criação, ele está pensativo.
"Orunmilá tem se mostrado como um dos deuses mais sábios e ponderados", pensa o deus do pano branco. "Acho que está na hora de elevá-lo a um grau de importância maior neste mundo".
Uma dúvida, porém, muito comum nestes casos, impede a decisão final do deus.
"É inteligente, mas terá sabedoria suficiente para ocupar o cargo que pretendo oferecer-lhe?"
É preciso, pois, testar a sabedoria do deus.
- Já sei! - exclama Oxalá, dando um tapa na testa - Vou aplicar-lhe um teste de sabedoria!
No mesmo instante manda Exu, o deus mensageiro, trazer Orunmilá até si.
- Aqui estou, grande deus - diz Orunmilá.
- Meu querido amigo, quero que me faça algo.
- Pois não, grande deus.
- Quero que me prepare o melhor prato do mundo.
Orunmilá, que não era exatamente um cozinheiro, meio que vacilou.
- O melhor prato do mundo?
- Sim, aquele que esplende não só no sabor, como na sabedoria.
" Um prato que esplende tanto no sabor quanto na sabedoria!", pensa Orunmilá, a coçar a cabeça.
- Está bem, grande deus, terá o seu prato sábio e saboroso - diz ele, numa súbita iluminação.
Orunmilá sai correndo dalí e começa a preparar o tal prato. Dalí a algumas horas retorna com uma grande travessa fumegante.
- Trouxe o prato que lhe pedí? - diz Oxalá, a lamber-se todo.
- Sim, grande deus, aqui está o mais sábio e saboroso dos pratos.
Oxalá espiou para o interior da travessa e viu uma grande língua de touro cozida com inhame.
- Hum, esté belo, de fato! - disse o deus, lambendo-se todo outra vez. - Mas diga-me uma coisa: por que escolheste este prato para ser o mais perfeito de toda a culinária?
- É que além de ser muito saboroso, traz em si uma mensagem implícita.
- Uma mensagem implícita?
- Sim, a língua em sí é um símbolo muito poderoso. Por ela, podemos desejar saúde para os outros. Por ela, podemos falar bem dos amigos e proclamar a retidão e a justiça. Por ela, podemos exaltar os deuses e todas as virtudes que a eles conduzem. São incontáveis, enfim, os bens que uma língua pode produzir!
Oxalá ficou tão satisfeito com a resposta que abraçou Orunmilá depois de comer a língua inteira.
- Sua resposta mostrou-se tão sábia quanto seu prato mostrou-se delicioso! Agora,
meu querido amigo, quero que me prepare a pior comida possível!
Orunmilá embatucou outra vez.
- A pior comida possível?
- Exatamente.
Orunmilá levou consigo a travessa e esteve o restante do dia a preparar a pior comida possível, até que, já quase ao entardecer, retornou com sua travessa repleta outra vez.
Oxalá olhou para a travessa fumegante com o nariz torcido.
"O que será que ele trouxe?", pensou, certo de que veria algo inteiramente repugnante.
Entretanto, quando Ifã desceu do alto a sua travessa, lá estava outra vez a língua do touro acomodada entre os inhames.
- Língua de touro outra vez? - exclamou Oxalá, com uma nota de decepção em sua voz.
- Sim, grande deus!
- Mas não entendo! Como a língua pode ser ao mesmo tempo a melhor e a pior comida possível?
- Pode ser a pior também, grande deus, porque, com a língua os homens podem cometer perjúrio contra os deuses e contra eles próprios. Podem caluniar e intrigar. Podem dizer mentiras e induzir ao erro uma alma boa e ingênua. São incontáveis, enfim, os males que uma língua pérfida pode cometer!
- Sábias palavras, disse o deus.
Por causa das duas sapientíssimas respostas que escutou, Oxalá tornou Orunmilá o primeiro babalorixá do mundo, palavra africana que significa "pai dos segredos".


Extraído de "As melhores histórias da mitologia africana", de A.S.Franchini e Carmen Seganfredo - Artes e Ofícios Editora Ltda., 2008



27 de maio de 2010

DOIS POEMAS DE NITO ALVES

Nito Alves (foto Associacao 27 de Maio)


PORTAS FECHADAS


Como se fecharam
Como estão encerradas
Como não se abrem
As portas para estas paragens
Para esta Região
Onde se luta
Onde as populações perecem
Onde os guerrilheiros triunfam
Triunfam
Triunfam
E morrem morrem na flor da juventude;
Onde as crianças se julgam abandonadas
Onde o cerco inimigo aperta
Mas… onde as vontades
E as consciências declaram:venceremos.


Silêncio nas consciências
Silêncio no pensar
Silêncio na madrugada
Silêncio
Silêncio nas massas populares
Silêncio no coração dos camponeses
Silêncio no quartel do guerrilheiro
Silêncio nos canos das armas vazias
Silêncio
Silêncio na pergunta
Silêncio na resposta
Silêncio na noite maliciosa
Silêncio no esperar.


Eis os túmulos abertos para combatentes que ainda respiram
A fortaleza que resiste ao desfio de fogo intenso
A nossa decisão inquebrantável
A nossa razão feita força invencível
E todos nós repetimos:venceremos



Somente do porvir
No seu terso linguajar
Na imparcialidade da sua justiça
Só de ti Povo
Aguardemos a revelação
Das várias mãos criminosas
Que estas portas fecharam.


Mas sabemos
Que nas mãos venenosas de certos filhos renegados da Pátria
Jazem chaves destas portas fechadas.


A História fará justiça?



O MEU POEMA É O POVO



O poeta não faz o poema
O poeta escreve a poesia

As massas fazem o poema de ouro que não podem escrever
o povo compõe belos versos que não pode desenhar.


Nos charcos se faz poema de guerra
nos campos arrasados pelas bombas de fogo
o povo canta um poema na travessia de um rio
que devora os que não sabem nem podem nadar
os mortos nos legam versos que não podem ler.


O meu poema não sei escrevê-lo também
não posso escrever o poema que sinto no peito
por serem vários os versos.
São tantos os autores do meu poema
e versos assim trazem rima doutra inspiração.


Rimam em cada metralha que dispara
rimam no chorar do órfão
rimam nas grutas protectoras do guerrilheiro.
Não sei escrever este poema.
Gostaria de cantar o poema que me bate no coração
mas não posso
porque este é o próprio Povo em armas
e só ele deve continuar
a fazer o poema que eu não posso redigir
nem ele pode ler também!


Os que fazem a História
Nem sempre podem escrevê-la.



Nito Alves (Angola) 1945 - 1977
 
Poemas retirados de: http://27maio.com/  

25 de maio de 2010

Blog da Semana - 08- 2010

Blog da semana volta de novo ao Brasil e aconselha: http://ellenismos.blogspot.com/



DO BARRO

Brincar com coisas sem nome
era o meu fraco.
Com morrinhos de terra molhada,
modelava objetos de sonhos.,
Qualquer forma se fazia coisa
para depois, entre mãos e sonhos,
de novo outra coisa
sempre outra.
Certo mesmo, só
a cor marrom com que pintei o tempo.

Ana de Santana

11 de maio de 2010

Blog da Semana - 07- 2010

O blog da semana é "Angola: Os Poetas", pela divulgacao dos poetas da bela literatura angolana. Visite: http://angolapoetas.blogspot.com/

Tela de Carla Peairo (Angola)

O HENDA I XALA


a loucura tocou as nossas mãos.
súbitas luzes passam nos teus olhos.
o excessivo pudor nos aproxima:
riqueza dos segredos revelados!

não importa a incerteza e o impossível:
deles e nós, conscientes, nos sorrimos.
para além do momento, nós sabemos:
o amor ficará – O HENDA I XALA.

Mário António (Angola)

10 de maio de 2010

THE ISLAND MAN

Grace Nichols


Morning

and island man wakes up
to the sound of blue surf
in his head
the steady breaking and wombing


wild seabirds
and fishermen pushing out to sea
the sun surfacing defiantly
from the east
of his small emerald island
he always comes back groggily groggily


Comes back to sands
of a grey metallic soar
to surge of wheels
to dull North Circular roar


muffling muffling
his crumpled pillow waves
island man heaves himself


Another London day

Grace Nichols (Guiana)

5 de maio de 2010

MOSS ON PLUM BRANCHES

James K. Baxter

Moss on plum branches and
A soft rain falling - no other house
Spread out its arms around me
As this has done - I go
From here with a gap inside me where a world
Has been plucked from my entrails - fire and
Food, flowers and faces
Painted on walls - the voices of two friends
Recalling the always present paradise
We enter and cannot remain in.

James K. Baxter (1926 - 1972) Nova Zelandia

3 de maio de 2010

Blog da Semana - 06- 2010

Desta feita o blog da semana é angolano: http://nguimbangola.blogspot.com/ Um excelente blog cultural e especialmente vocacionado para a cultura angolana. O autor também publica seus textos poéticos. A visitar!



VIVA O LIVRO!

o livro, o livro, o livro

o livro, o livro, o livro
o autor, o autor, o autor
mas o livro, mas o livro, mas o livro
mas o autor, mas o autor, mas o autor
o livro e o autor, o livro e o autor
e os direitos do autor, o livro, e o livro
o livro, a cultura, a leitura

o livro, a cultura, a leitura
leitura&cultura, leitura&cultura
literatura, leitura, tertúlia, leitura, cultura
o livro, o livro, o livro
o livro, o livro, o livro
o autor do livro, leitura do livro
o autor do livro, leitura do livro
Cervantes, Shakespeare,

a rosa e o livro
o livro e a rosa
abril, abre o livro, São Jorge
e o livro do livro?
leitura dos livros e dos livros
na cultura dos livros a leitura dos livros
e de se fazerem livros não há fim
mas em Abril o livro é pensado
proclamado, o livro o direito do autor
te amo livro meu
viva o livro

28 de abril de 2010

Blog da Semana - 05- 2010

Para esta semana o Blog escolhido vem de novo da outra margem do grande-rio Atlantico: http://enredosetramas.blogspot.com/ um blog que, como todos os outros vale a pena visitar, por muitos e bons motivos.



Bucólica


A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;
De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De sombra de uma figueira:
Meu pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha.

Miguel Torga


Ah, eu sempre acho que é tempo de ler e reler o grande escritor português Miguel Torga (1907-1995), com sua sabedoria encravada na terra e seu conhecimento das essências. Agora, quando o mundo se torna cada dia mais aparente e espetaculoso, quando artistas da palavra e da imagem tentam reduzir a arte à afetação dos efeitos especiais, penso que é cada vez mais preciso descobrir e reler Miguel Torga.
Tive a alegria de conhecê-lo pessoalmente em seu pequeno consultório em Coimbra, nos distantes anos 70. Eu muito jovem, acompanhada de um amigo tão jovem quanto eu, levava um bilhete e uma encomenda enviadas do Brasil por meu tio, o escritor Jorge Amado, amigo dele. Torga, que era médico, nos recebeu assim que seu paciente deixou a sala. Foi solícito, gentil, carinhoso, falou-nos um pouco de Coimbra, pediu que agradecéssemos ao tio a gentileza do mimo, perguntou por ele, e ali mesmo escreveu um bilhete ao amigo brasileiro.
Eu, que já era grande admiradora dos textos de Torga, fiquei observando sua letra um pouco trêmula, o jaleco imaculadamente branco, o perfil fino inclinado sobre o papel, os cabelos brancos... Estava emocionada pela oportunidade de conhecer pessoalmente um dos meus escritores preferidos, e procurei conversar um pouco com ele, para prolongar a situação. Quando já atravessávamos a porta de saída, ele nos chamou de volta, sorriu de forma delicada, e nos disse:
— Obrigado por trazerem a juventude a esta humilde morada. Eu hoje estava a precisar disso, e se calhar nem o sabia.

20 de abril de 2010

Blog da Semana - 04 - 2010

O blog da semana para visitar é CIRANDEIRA: http://giramundo-cirandeira.blogspot.com/


EL OTRO TIGRE

Pienso en un tigre. La penumbra exalta

la vasta Bibliotece laboriosa
y parece alejar los anaqueles;
fuerte, inocente, ensangrentado y nuevo,
el irá por su selva y su mañana
y marcará su rastro en la limosa
margen de un rio cuyo nombre ignora;
(en su mundo no hay nombres, ni pasado,
ni porvenir, solo un instante cierto.)
Y salvará las bárbaras distancias
y husmeará en el trenzado laberinto
de los olores el olor del alba
y el olor deleitable del venado
Entre las rayas del bambú descifro
sus rayas y presiento la osatura
bajo la piel espléndida que vibra
En vano se interponem los convexos
mares y los desiertos del planeta;
desde esta casa de un remoto puerto
de América del Sur, te sigo y sueño
oh tigre de las márgenes del Ganges
Cunde la tarde en mi alma y refexiono
que el tigre vocativo de mi verso
es un tigre de símbolos y sombras,
una serie de tropos literarios
y de memorias de enciclopedia
y no el trigre fatal, la aciaga joya
que, bajo el sol o la diversa luna,
va cumpliendo en Sumatra o en Bengala
su rutina de amor, de ocio y de muerte
Al tigre de los símbolos he opuesto
el verdadero, el de caliente sangre
el que diezma la tribu de los búfalos
y hoy 3 de agosto del 59,
alarga en la pradera una pausada
sombra, pero ya el hecho de nombrarlo
y de conjeturar su circunstancia
lo hace ficción del arte y no criatura
viviente de las que andan por la tierra
Un tercer tigre buscaremos. Este
será como los otros una forma
de mi sueño, un sistema de palabras
humanas y no el tigre vertebrado
que, mas allá de las mitologias,
pisa la tierra. Bien lo sé, pero algo
me impone esta aventura indefinida,
insensata y antigua, y persevero
en buscar por el tiempo de la tarde
el otro tigre, el que no está en el verso


Jorge Luís Borges - El Hacedor, in Obra Poética - 1923-1985 - B. Aires, 1989

O outro tigre
Penso em um tigre. A penumbra exalta
a vasta Biblioteca laboriosa
e parece afastar as prateleiras;
forte, inocente, ensanguentado e jovem
ele irá por sua selva, e sua manhã,
marcando seu rastro na lamacenta
margem de um rio cujo nome ignora
(Em seu mundo não existem nomes, nem passado, nem porvir
somente o instante exato.)
E vencerá as bárbaras distâncias
e farejará na renda labiríntica
dos aromas, o aroma do veado.
Por entre as raias do bambú, decifro
suas rais e pressinto a ossatura que vibra
sob a pele esplêndida.
Em vão se interpõem os convexos
mares e os desertos do planeta;
desta casa, de um porto da América do Sul, te sigo e sonho
ó tigre das margens do Ganges.
Cresce a tarde na minh'alma e reflito
que o tigre evocativo do meu verso
é um tigre de símbolos e sonhos,
uma série de tropos literários
e de memórias de enciclopédia
e que o tigre fatal, azíaga jóia, que,
sob o sol ou a diversa lua,
vai cumprindo em Sumatra ou Bengala
sua rotina de amor, de ócio e de morte.
Ao tigre dos símbolos, opus
o real, o que tem sangue quente,
o que dizima a manada dos búfalos
e hoje, 3 de agosto de 1959,
estende sobre a planície uma pausa
da sombra, mas já o fato de nomeá-lo
e de conjecturar sua circunstância,
o faz ficção artística e não criatura
viva das que andam pela terra.
Um terceiro tigre busquemos. Este
será como os outros uma forma de meu sonho,
um sistema de palavras humanas
e não o tigre vertebrado
que, mais além das mitologias,
pisa a terra. Bem sei, entretanto,
que algo me impõe esta aventura indefinida
insensata e antiga, e persevero
em buscar pelo tempo nesta tarde
o outro tigre, o que não está no verso.