27 de dezembro de 2009

UMA LÍNGUA MORRE A CADA 14 DIAS

Com a devida permissao esta postagem foi retirada do blogue mocambicano, "Diário de um Sociólogo" http://oficinadesociologia.blogspot.com/ visite!
 



Uma língua morre em cada 14 dias. Em 2100, terá desaparecido mais de metade das sete mil línguas faladas no planeta.
Confira http://www.nationalgeographic.com/mission/enduringvoices/. Clique com o lado esquerdo do rato sobre a imagem para a ampliar. Obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, por me ter alertado para o fenómeno.


Meus agradecimentos a Carlos Serra, autor do blogue citado!

26 de dezembro de 2009

O MINDERICO -

 Li no blog Diário de um Sociólogo (http://oficinadesociologia.blogspot.com/ ) que uma língua morre a cada 14 dias. Lembrei-me  de pesquisar na nossa língua e no espaco que ela abarca, encontrei o Minderico, em Portugal.



Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.


O Minderico ou Piação dos Charales do Ninhou é a variante linguística falado em Minde desde o século XVIII. Inicialmente esta variante funcionava como código entre os habitantes de Minde, para negociações. O povo minderico é por natureza um povo negociante.
Fruto de uma comunidade fechada, localizada num vale, entre as duas serras (a d'Aire e a dos Candeeiros), o minderico, incialmente enquanto língua secreta, era semelhante a variantes que encontramos noutros grupos e comunidades étnicas específicas espalhadas pelo mundo que usam "termos e expressões de defesa", isto é, palavras e expressões que permitem aos membros dessa comunidade falar entre si sem darem a conhecer o significado dessa comunicação a outros. Porém, o minderico ultrapassou as barreiras do secretismo e alargou-se não só as todos os grupos sociais da comunidade minderica como passou a ser usado em todos os contextos sociais (não só para o negócio). Esta evolução - de língua secreta a língua do quotidiano - não é exclusiva do minderico, tendo-se registado já noutras comunidades em diferentes partes do mundo.
Em muitos dos lexemas mindericos é notória a sua origem em imagens do quotidiano, que passam de forma figurativa para a linguagem, mas também, embora em menor quantidade, através de alterações do português vernáculo, não esquecendo também os desenvolvimentos propriamente mindericos. Nomes de pessoas da terra deram origem a expressões que designam profissões ou atributos humanos. O minderico é ainda hoje conhecido pela maioria da população adulta, embora por influência da alteração dos costumes, haja uma acentuada tendência para o seu desuso e esquecimento entre os mais jovens.
Existem várias edições de Dicionários de Minderico, onde se encontram as palavras traduzidas de português para minderico e minderico para português. Estes dicionários estão disponíveis no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro.

Medidas de Defesa

Actualmente o minderico está a ser alvo de alguns projectos como forma de revitalização, de forma a que não caia no esquecimento. Como exemplo temos:
Aulas de minderico no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro para as várias faixas etárias.
Actualização do dicionário já existente.
Utilização do minderico em festas, celebrações de Minde e nos meios de comunicação social.
Tradução das placas toponímicas de Minde, das ementas dos restaurantes e das tabelas dos cafés.
Projecto de documentação, sediado na Universidade de Regensburg e inserido no Programa de Documentação de Línguas Ameaçadas,com o apoio financeiro da Fundação Volkswagen.
Criação de suporte virtual que permita a aprendizagem do minderico por qualquer pessoa

Palavras em Minderico


abobrar - descansar;
alexandrinas - fotografias;
ambrosiar - pensar, cismar;
albertinas - bolachas;
babosas - cervejas;
badelo - língua;
bodelha - mentira;
borboleta - luz;
brancano – leite;
bruxo - computador;
Casal Médio - Santarém;
cabaneira - vaca;
campinos - melões;
carranchano - amigo;
fusca - noite;
gargantear – cantar;
jordar – fazer, gastar, despejar, desperdiçar;
latina - missa;
Casal Grande - Lisboa;
mioleira – testa;
mirantar – ver, observar;
Ninhou - Minde;
nazaré - banho;
neto - dinheiro;
paivante - cigarro;
patarraz da ladina - genro;
perneiras - peúgas;
piação - conversa;
pirota - motorizada;
quadrazal - mês;
remexido - negócio;
renhomnhom - gaita de foles ;
rinchão - comboio;
rodilha - sogra;
ronquinho - surdo;
senhor antónio - marido atraiçoado pela esposa, corno;
sesta - semana
soletra - livro;
tarrantar - dormir;
tece-tece - Internet;
terraizinho - criança;
terraizinho judaico - Menino Jesus;
tosadeira - boca;
toupeira do ferreiro - charrua;
videira - mãe;
videiro - pai;
vista-baixa - porco;
zé pedro – bigode

18 de dezembro de 2009

O MEU AMO

O meu amo em fúrias
E falas de arrelias
Aportou mal-humorado ao palácio
Dos sonhos e silêncio
E num estrondo resoluto
Gritou ser amo e amante absoluto!


Trovejou fortes trovoadas
Arregaçou uma camisa
De costas corroídas de pobreza
E magreza
Trovejou às paredes de casa
E tempestuou páginas revoltadas!


Mostrou um peito desmusculado
Diluído em mágoas de álcool
E cansaços de sol
Um velho-peito-robusto
Desgastado e agastado
Em magras costelas de desgosto!


Gritou gestos abruptos
No vazio das panelas
Dos bolsos rotos
Gritou desespero às janelas
E resmungou um silêncio amuado
Um silêncio, o meu pobre amado!


Depois procurou meus mistérios
E o mansinho dos delírios
Conduziu-me a novos portos
Ressonou a nova aurora
Com ventos d’outrora
Ressonou um sonho de gemidos fartos!


Décio Bettencourt Mateus (Angola)
in Xé Candongueiro.
Luanda, 23 de Abril de 2007.

10 de dezembro de 2009

DO BLOG AS VIAGENS DE ALEX

Um olhar vago, outro tímido

A VELHA E A BEBÉ





[Texto e Foto: Alexandre Correia]

À beira da estrada, uns quilómetros mais abaixo de Sumbe, no mercado improsivado junto da ponte sobre o rio Quicombo, aquela velha que vendia bananas já amarelecidas despertou-me a atenção: estava ali, sentada no chão de terra, como se não houvesse mais ninguém por perto para além dela própria e da sua neta. O olhar vago, que não escondia tristeza, não explicava essa indiferença. Quando me aproximei e perguntei se as bananas eram boas para comer cruas, baixou os olhos e respondeu com um murmúrio tão baixinho que tive de ajoelhar-me também no chão para a conseguir escutar. Disse que não, que eram para cozinhar. A neta, assustada, já se tinha refugiado no colo da velha, escondendo a cara no ombro da avó. A bebé também não tinha um olhar feliz, mas não era triste como o da velha. Nem indiferente. Era apenas tímido, pois denunciou a sua curiosidade ao espreitar-me pelo canto do olho. Mas tal como a velha, quando os meus olhos se cruzaram com os da bebé, ela não resistiu e escondeu-se de novo, encaixando a cara entre o ombro e o pescoço da avó. Para logo a seguir voltar a espreitar sorrateiramente... Só largou a protecção do colo da velha quando eu me afastei. E então voltou a brincar sozinha no chão, enquanto a velha permanecia imóvel, com aquele olhar distante e triste, que eu nunca mais esqueci.

Alexandre Correia (Portugal)

7 de dezembro de 2009

VIRIATO DA CRUZ E O PODER DA POESIA


Se não estivesse morto (morri em Pequim a 13 de Junho de 1973) festejaria no próximo dia 25 de Março 81 anos. Há quem ache que Angola poderia ser hoje um país muito diferente se eu não tivesse morrido tão jovem, mesmo às portas da Revolução de Abril em Portugal, e das grandes mudanças que a mesma implicou para o meu país. Sinto-me lisonjeado com tais opiniões, mas acho-as exageradas. É verdade que um único homem pode em certas circunstâncias alterar a correnteza da História – basta pensar em Nelson Mandela, sem o qual o regime do apartheid talvez não se tivesse desmoronado de forma pacífica. Olhando para trás, porém, sou forçado a admitir que o mau génio que sempre me dominou teria arruinado nesse futuro imaginário, como arruinou no duro passado real, qualquer encontro meu com a Senhora História.




Não me parece provável que em 1974 tivesse conseguido unir os diferentes movimentos nacionalistas angolanos. Não eu, um dos primeiros militantes do MPLA que se atreveu a contestar a liderança de Agostinho Neto e ousou romper com o partido para se juntar aos homens de Holden Roberto. Isto antes de romper com todos, a murro e à cacetada, e ficar completamente só. Levei a minha propensão iconoclasta sempre muito a sério. Tão a sério que um dia, em Pequim, onde estava exilado, quebrei um busto de Mao em público. Os meus anfitriões chineses ao invés de me expulsarem, como eu pretendia, condenaram-me a uma espécie de prisão domiciliária, ao ostracismo mais feroz, à penúria. Morri e enterraram-me sem testemunhas no cemitério dos estrangeiros. Se tivesse resistido mais alguns meses poderia ter conseguido deixar Pequim e recomeçar uma vida nova em Paris ou em Lisboa, onde me aguardavam muitos amigos.



Cheguei sempre cedo demais. Nunca soube esperar. Até para morrer fui impaciente.



Resumindo: vivo não teria ajudado a evitar nem a guerra civil, nem o desastrado pesadelo totalitário que em poucos anos, sob o olhar perplexo do camarada Neto, arruinou Angola. Em contrapartida talvez me tivesse dedicado à poesia, aprofundando a meia dúzia de caminhos que sugeri em outros tantos versos ingénuos. É graças a esses versos que por excessiva indulgência da crítica, ou excessiva ignorância, muitos insistem em chamar-me poeta.



Nos anos 40 e 50 eu e mais alguns companheiros começámos a escrever poesia na intenção de despertar as massas. A poesia deveria servir, no nosso entender, para preparar o terreno para a insurreição nacionalista. E assim foi. Contrariando os cépticos, demonstrámos que a poesia pode mudar o mundo. Primeiro os versos, depois as balas. A seguir demos razão aos cínicos: mudar, mudámos, mas não para melhor. Acontece que, infelizmente os poemas que então produzimos estavam longe da excelência. Faltou-nos labor literário. Talvez com boa poesia pudéssemos ter obtido melhores resultados na política. Não deixei de acreditar no poder da poesia. Nem sequer na necessidade de levar a poesia ao poder. O problema (suspeito) foi a qualidade dessa poesia – e dos seus poetas. Não é possível cozinhar um bom funge com farinha ruim.



Se não tivesse morrido em 1973 estaria agora a confrontar-me – inclusive a murro e à cacetada, caso não me faltasse o fôlego, mas em todo o caso possuído pelo mesmo espírito iconoclasta – com todos quantos impedem a afirmação de um novo pensamento e de uma nova criatividade, capaz de iluminar consciências e de preparar terreno para outras insurreições, outras libertações. Vez por outra oiço alguém utilizar, a propósito do regime angolano, a expressão «pensamento totalitário», e rio-me às gargalhadas do alto da minha nuvem – eis aqui um belo oximoro. Não sei quanto tempo vai levar (o que no estado em que me encontro é indiferente) mas sei que mais tarde ou mais cedo a boa poesia acabará por se impor e triunfar.




Crónica publicada na edição nº 78 (Março) da LER. Ilustração de Pedro Vieira.



© publicado pela Ler às 11:32 aqui: http://ler.blogs.sapo.pt/338179.html