29 de outubro de 2007

ANA PAULA TAVARES


Ana Paula Tavares nasceu na Huíla, Sul de Angola em 1952.

Historiadora, mestre em Literaturas Africanas de

Língua Portuguesa. Prepara um doutoramento em

História.

Em Angola publicou Ritos de Passagem

(poemas),UEA, 1985.

Em Cabo Verde, Praia, O Sangue da

Buganvília, Crónicas 1998.

Na Editorial Caminho, Lisboa, publica O Lago da Lua, (poemas, 1999), Dizes-me coisas amargas como os frutos (poemas) 2001; Ex-Votos (poemas), 2003.

Em 2005 o romance Os Olhos do Homem que Chorava no Rio.

Tem participação com poesia e prosa em várias Antologias

em Portugal, França, Alemanha, Espanha, Brasil.

Publicou alguns ensaios sobre História de Angola.

Em 2004 foi-lhe atribuído o Prémio Mário António (para Poesia)

da Fundação Calouste Gulbenkian.








AMARGOS COMO OS FRUTOS





“Dizes-me coisas tão amargas como os frutos...”

Kwanyama



Amado, porque voltas



com a morte nos olhos

e sem sandálias

como se um outro te habitasse

num tempo

para além

do tempo todo



Amado, onde perdeste tua língua de metal

a dos sinais e do provérbio

com o meu nome inscrito



onde deixaste a tua voz

macia de capim e veludo

semeada de estrelas



Amado, meu amado

o que regressou de ti

é a tua sombra

dividida ao meio

é um antes de ti

as falas amargas

como os frutos





In Dizes-me Coisas Amargas como os Frutos, 2002







O LAGO DA LUA



No lago branco da lua
lavei meu primeiro sangue
Ao lago branco da lua
voltaria cada mês
para lavar
meu sangue eterno
a cada lua

No lago branco da lua
misturei meu sangue
e barro branco
e fiz a caneca
onde bebo
a água amarga da minha sede sem fim
o mel dos dias claros
Neste lago deposito
minha reserva de sonhos para tomar



In O Lago da Lua, 1999



A ABÓBORA MENINA


Tão gentil de distante, tão macia aos olhos
vacuda, gordinha,
de segredos bem escondidos
estende-se à distância
procurando ser terra
quem sabe possa
acontecer o milagre:
folhinhas verdes
flor amarela
ventre redondo
depois é só esperar
nela desaguam todos os rapazes.


In Ritos de Passagem, 1985


Ana Paula Tavares (Angola)



Galardoada com o Premio Nacional de Cultura e Artes, Edicao de 2007 com o livro "Manual para Amantes Desesperados"

CONFIDÊNCIA



Diz o meu nome
pronuncia-o
como se as sílabas te queimassem os lábios
sopra-o com a suavidade
de uma confidência
para que o escuro apeteça
para que se desatem os teus cabelos
para que aconteça

Porque eu cresço para ti
sou eu dentro de ti
que bebe a última gota
e te conduzo a um lugar
sem tempo nem contorno

Porque apenas para os teus olhos
sou gesto e cor
e dentro de ti
me recolho ferido
exausto dos combates
em que a mim próprio me venci

Porque a minha mão infatigável
procura o interior e o avesso
da aparência
porque o tempo em que vivo
morre de ser ontem
e é urgente inventar
outra maneira de navegar
outro rumo outro pulsar
para dar esperança aos portos
que aguardam pensativos

No húmido centro da noite
diz o meu nome
como se eu te fosse estranho
como se fosse intruso
para que eu mesmo me desconheça
e me sobressalte
quando suavemente
pronunciares o meu nome



Mia Couto (Mocambique)

OS RIOS ATONITOS

Rio Zaire, perto do Soyo



Ouvindo "Kongo", por Miriam Makeba



Há palavras a dormir sobre o seu largo
assombro
Por exemplo, se dizes Quanza ou dizes Congo
é como se houvesse pronunciado os próprios
rios
Ou seja, as águas
pesadas de lama, os peixes todos e os perigos
inumeráveis
O musgo das margens, o escuro
mistério em movimento.

Dizes Quanza ou dizes Congo e um rio corre
Lento
em tua boca.

Dizes Quanza
e o ar se preenche de perfumes perplexos.

E dizes Congo
e onde o dizes há grandes aves
e súbitos sons redondos e convexos.

E dizes Quanza, ou dizes Congo
e sempre que o dizes acorda em torno
um turbilhão de águas:
a vida, em seu inteiro e infinito assombro.





José Eduardo Agualusa (Angola)

GUERNICA, AGONIA DE UMA GUERRA


Guernica de Pablo Picasso


Completaram-se em 26 de abril setenta anos do massacre de Guernica por tropas da direita espanhola apoiadas por soldados nazistas. Durante
quatro décadas, a autoria do crime foi ocultada: só a obra-prima de
Picasso serviu como testemunha.





23 de outubro de 2007

WELWITSCHIA MIRABILIS * TOMBWA

Flor da Welwitschia, ao lado cone masculino.
Abaixo, o cone feminino.



Ciclo germinatorio da welwitschia

Duas Welwitschias mirabilis / Tombwa


Welwitschia é um género monotípico de plantas suculentas consistindo numa única espécie, a famosa Welwitschia mirabilis Hook. f. que só existe no deserto do Namibe, na Namíbia e em Angola. As Welwitschias são plantas gnetófitas da classe Gnetopsida, pertencentes à ordem Welwitsciales e família Welwitschiaceae.

É uma planta rasteira, formada por um caule lenhoso que não cresce, uma enorme raiz aprumada e duas folhas apenas, provenientes dos cotilédones da semente; as folhas, em forma de fita larga, continuam a crescer durante toda a vida da planta, uma vez que possuem meristemas basais. Com o tempo, as folhas podem atingir mais de dois metros de comprimento e tornam-se esfarrapadas nas extremidades. É difícil avaliar a idade que estas plantas atingem, mas pensa-se que possam viver mais de 1000 anos.

A Welwitschia mirabilis é uma planta dióica, ou seja, os cones masculinos e femininos nascem em plantas diferentes. Tradicionalmente, esta espécie foi classificada como uma gimnospérmica (juntamente com os pinheiros e plantas semelhantes), mas actualmente é classificada como uma gnetófita, uma divisão das plantas verdes que produzem sementes (espermatófitas).

Apesar do clima em que vive, a Welwitschia consegue absorver a água do orvalho através das folhas. Esta espécie tem ainda uma característica fisiológica em comum com as crassuláceas (as plantas com folhas carnudas ou suculentas, como os cactos): o metabolismo ácido - durante o dia, as folhas mantêm os estomas fechados, para impedir a transpiração, mas à noite eles abrem-se, deixam entrar o diôxido de carbono necessário à fotossíntese e armazenam-no, na forma dos ácidos málico e isocítrico nos vacúolos das suas células; durante o dia, estes ácidos libertam o CO2 e convertem-no em glicose através das reacções conhecidas como ciclo de Calvin.

Esta espécie foi baptizada a partir do nome do Dr. Friedrich Welwitsch, que contribuiu para o conhecimento desta e de muitas outras plantas de Angola.

Devido às suas características únicas, incluindo o seu lento crescimento, a Welwitschia é considerada uma espécie ameaçada. No entanto, pensa-se que as plantas que vivem em Angola estão mais protegidas que as da Namíbia, devido às minas terrestres que protegem o seu habitat.

A planta pode ser cultivada a partir de sementes, que têm de ser mantidas húmidas e expostas a calor e luz intensos durante as primeiras semanas. As sementes colhidas no campo estão normalmente contaminadas com esporos do fungo Aspergilus niger e normalmente apodrecem a seguir à germinação, mas as sementes do Jardim Botânico de Kirstenbosch, na Cidade do Cabo (África do Sul), ou de outras fontes de cultivo, estão normalmente livres daquele fungo.




(Artigo retirado de wikipedia)

22 de outubro de 2007

PINTURAS DE ALBANO NEVES E SOUSA








Albano Neves e Sousa (Albano Silvino Gama de Carvalho das Neves e Sousa) nasceu em 1921 em Matosinhos, Portugal. Fez o curso do liceu em Luanda, Angola. Faleceu em Salvador, em 11 de maio de 1995. Além de pintor, era também poeta e soube retratar como ninguém as belezas do povo e da terra de Angola, a sua grande paixão. A sua obra pode ser vista em países como Brasil, Portugal, Espanha, África entre outros. O resultado de seu trabalho vinha das inúmeras viagens que fez e dos desenhos acompanhados por anotações que não deixavam que a memória de tudo o que via se perdesse no tempo.

Jorge Amado, em texto dedicado ao catálogo de uma das exposições do pintor, o definiu como um artista completo, apaixonado e exigente. Segundo Amado, Neves e Sousa incorporou-se à vida baiana de corpo e alma, não sabia guardar distância, viver isolado, sozinho. Era um ser solidário, um criador de arte nascida da intimidade com o povo.

17 de outubro de 2007

Cantar de Emigração


Este parte, aquele parte
e todos, todos se vão
Galiza
ficas sem homens
que possam cortar teu pão
Tens em troca
órfãos e órfãs
tens campos
de solidão
tens mães que não têm filhos
filhos que não
têm pai
Coração
que tens e sofre
longas
ausências mortais
viúvas de vivos mortos
que ninguém
consolará



Rosália de Castro (Galiza - Espanha)

ANTONIO RAMOS ROSA








António Ramos Rosa, poeta e ensaísta português, natural de Faro, onde nasceu a 17 de Outubro de 1924.








Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob as montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este braço
que é uma arma de dois gumes amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração.




Antonio Ramos Rosa (Portugal)

16 de outubro de 2007

ADRIANO CORREIA DE OLIVEIRA






Adriano Correia de Oliveira (Avintes, 9 de Abril de 1942 — Avintes, 16 de Outubro de 1982), foi um músico português e um dos mais importantes intérpretes do fado de Coimbra. Fez parte da geração de compositores e cantores de cariz político, que foram usadas para lutar contra o Estado Novo e que ficou conhecida como música de intervenção.

Adriano Maria Correia Gomes de Oliveira nasceu em Avintes, em 9 de Abril de 1942, no seio de uma família tradicionalista católica. Tirou o curso do liceu no Porto. Em Avintes iniciou-se no teatro amador e foi co-fundador da União Académica de Avintes. Em 1959 rumou a Coimbra, onde estudou Direito, tendo sido repúblico na Real Repúbica Ras-Teparta. Foi solista no Orfeon Académico de Coimbra e fez parte do Grupo Universitário de Danças e Cantares e do Círculo de Iniciação Teatral da Académica de Coimbra. Tocou guitarra no Conjunto Ligeiro da Tuna Académica. No ano seguinte editou o primeiro EP acompanhado por António Portugal e Rui Pato. Em 1963 saiu o primeiro disco de vinil "Fados de Coimbra" que continha Trova do vento que passa, essa balada fundamental da sua carreira, com poema de Manuel Alegre, em consequência da sua resistência ao regime Salazarista, e que as suas movimentações levaram a gravar, foi o hino do movimento estudantil.



14 de outubro de 2007

CITACAO DE GANDHI

You must not lose faith in humanity. Humanity is an ocean; if a few drops of the ocean are dirty, the ocean does not become dirty.
MAHATMA GANDHI

10 de outubro de 2007

LIVRO DO DESASSOSSEGO


Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas. Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de nenhuma espécie - nem sequer mental ou de sonho -, transmudou-se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta de outros. Estremeço se dizem bem. Tal página de Fialho, tal página de Chateaubriand, fazem formigar toda a minha vida em todas as veias, fazem-me raivar tremulamente quieto de um prazer inatingível que estou tendo. Tal página, até, de Vieira, na sua fria perfeição de engenharia sintáctica, me faz tremer como um ramo ao vento, num delírio passivo de coisa movida.

Como todos os grandes apaixonados, gosto da delícia da perda de mim, em que o gozo da entrega se sofre inteiramente. E, assim, muitas vezes, escrevo sem querer pensar, num devaneio externo, deixando que as palavras me façam festas, criança menina ao colo delas. São frases sem sentido, decorrendo mórbidas, numa fluidez de água sentida, esquecer-se de ribeiro em que as ondas se misturam e indefinem, tornando-se sempre outras, sucedendo a si mesmas. Assim as ideias, as imagens, trémulas de expressão, passam por mim em cortejos sonoros de sedas esbatidas, onde um luar de ideia bruxuleia, malhado e confuso.

Não choro por nada que a vida traga ou leve. Há porém páginas de prosa que me têm feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez numa selecta o passo célebre de Vieira sobre o rei Salomão. «Fabricou Salomão um palácio...» E fui lendo, até ao fim, trémulo, confuso: depois rompi em lágrimas, felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquele movimento hierático da nossa clara língua majestosa, aquele exprimir das ideias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores ideais - tudo isso me toldou de instinto como uma grande emoção política. E, disse, chorei: hoje, relembrando, ainda choro. Não é - não - a saudade da infância de que não tenho saudades: é a saudade da emoção daquele momento, a mágoa de não poder já ler pela primeira vez aquela grande certeza sinfónica.

Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. Mas odeio, com ódio verdadeiro, com o único ódio que sinto, não quem escreve mal português, não quem não sabe sintaxe, não quem escreve em ortografia simplificada, mas a página mal escrita, como pessoa própria, a sintaxe errada, como gente em que se bata, a ortografia sem ípsilon, como o escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.

Sim, porque a ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-ma do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha.






Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.I. Fernando Pessoa.



(Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.

Lisbon Revisited (1923)



NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!


Álvaro de Campos


SONETO DE ANTONIO BOTTO



Se, para possuir o que me é dado,
Tudo perdi e eu própio andei perdido,
Se, para ver o que hoje é realizado,
Cheguei a ser negado e combatido.

Se, para estar agora apaixonado,
Foi necessário andar desiludido,
Alegra-me sentir que fui odiado
Na certeza imortal de ter vencido!

Porque, depois de tantas cicatrizes,
Só se encontra sabor apetecido
Àquilo que nos fez ser infelizes!

E assim cheguei à luz de um pensamento
De que afinal um roseiral florido
Vive de um triste e oculto movimento



António Botto (Portugal)



A biografia de Botto está adornada pelo escândalo e controvérsia e o elogio de contemporâneos como António Machado, Miguel de Unamuno, Camilo Pessanha, Virginia Wolf, Teixeira de Pascoais, Luigi Pirandello, Stephan Zweig e Rudyard Kipling, que o consideram um dos poetas mais brilhantes do seu tempo. James Joyce chamou-lhe " o poeta do amor e da paixão". Porém, e apesar da sua genialidade, este poeta, dramaturgo e contista do século XX, tem sido , injustamente, pouco recordado na literatura de expressão portuguesa e universal.

9 de outubro de 2007

CHE GUEVARA




Contra ti se ergue a prudência dos inteligentes e o arrojo dos patetas
A indecisão dos complicados e o primarismo
Daqueles que confundem revolução com desforra

De poster em poster a tua imagem paira na sociedade de consumo
Como Cristo em sangue paira no alheamento ordenado das igrejas

Porém
Em frente do teu rosto
Medita o adolescente à noite no seu quarto
Quando procura emergir de um mundo que apodrece



Sofia de Mello Breyner Andresen

CHE GUEVARA - 9 DE OUTUBRO DE 1967














O CULTO DE UM ICONE



A reprodução da imagem de Che Guevara em camisetas e pôsteres geralmente utiliza uma famosa pintura feita pelo artista plástico irlandês radicado nos EUA Jim Fitzpatrick a partir da foto tirada por Alberto Korda, que se tornou a segunda imagem mais difundida da era contemporânea, atrás apenas de uma imagem de Jesus Cristo.
A imagem do Che é mítica em toda a America Latina. Na localidade onde foi assassinado em 1967, ergue-se actualmente uma estatua em sua homenagem. Passou a ser conhecido na região como "San Ernesto de La Higuera
" e é cultuado como santo pela população local.
O atual regime cubano ainda hoje homenageia Che Guevara. Estas homenagens contribuiem para a imagem positiva do regime junto à sociedade
.






Biografia




Ernesto Guevara de la Serna nasceu em 14 de junho de 1928 em Rosário, importante cidade industrial Argentina ao norte de Buenos Aires.
Ernesto tinha dois anos quando sofreu o primeiro ataque de asma. Esses ataques de asma sofridos por Ernesto durante a infância foram muito violentos e em vista do menino não melhorar, os médicos aconselharam uma mudança de ares.
Foi assim que, em 1932, contava Ernesto quatro anos, a família mudou-se para a região de Cordoba, no centro da Argentina, que na altura não era ainda a zona industrial que hoje é. Radicaram-se em Altagracía, uma pequena estância de veraneio, não muito longe da cidade de Córdoba. Viviam numa casa de estilo inglês, uma cottage chamada Villa Nidia.
A sua educação primaria, devido à asma foi-lhe dada pela mãe. Em 1941, contava Ernesto doze anos, a família mudou-se para a cidade de Córdoba. Foi titular do primeiro time de juniores do Velez Sarsfield.
Por volta dos 12 ou 13 anos lia frequentemente. A família possuía uma vasta biblioteca, cerca de três mil volumes. Sabe-se que leu Julio Verne, Alexandre Dumas, Baudelaire, Neruda e Freud aos 15 anos. Em 1944, os negócios da família de Che vão mal e Ernesto emprega-se como funcionário da Câmara de uma vila nos arredores de Córdoba para ajudar as finanças em casa, sem deixar, contudo, de estudar.
Em 1946 terminou o liceu. Os Guevara mudaram-se para Bogota e Ernesto ingressou na universidade. Continuando a situação economica a deteriorar-se, foram obrigados a vender com prejuízo a plantação de coca que tinham desenvolvido. Na capital, Ernesto empregou-se outra vez como funcionário municipal e mais tarde numa tipografia, continuando, não obstante, o curso de medicina. Houve um período durante o qual trabalhou como voluntário num instituto de pesquisas sexuais, então mantido pelo partido comunista. Nesse ano de 1946 foi chamado ao servico militar, que, ironicamente, o recusou por inaptidão física.
Depois da Segunda Guerra Mundial, com a vitória dos aliados, a oposição a Juan Domingo Peron ganhou novo ânimo. Os estudantes constituiram a sua chamada mais aguerrida. Guevara participou nessas lutas.
Fez uma viagem, começada de bicicleta e terminada a pé, pelas províncias argentinas de Tucuman, Mendoza, Salta, Jujuy e La Rioja, na qual percorreu diversos resorts Andinos.
E em 1951, ainda não tinha terminado a formatura em Medicina, iniciou, com Alberto Granado, uma grande viagem pelo continente na velha moto do companheiro conhecida pelo nome de "La Poderosa". Nessa viagem, Guevara começa a ver a America Latina como uma única entidade economica e cultural. Visita minas de cobre, povoações indígenas e leprosários, interagindo com a população, especialmente os mais humildes. De volta à Argentina em 1953 acaba os estudos de Medicina e passa a dedicar-se à politica.
Em julho de 1953, inicia sua segunda viagem pela America Latina. Nessa oportunidade visita Bolivia, Peru, Equador, Colombia, Panama, Costa Rica, El Salvador e Guatemala.
Foi por causa da visao de tanta miseria e impotencia e das lutas e sofrimentos que presenciou em suas viagens que o jovem Ernesto Guevara concluiu que a única maneira de acabar com todas as desigualdades sociais era promovendo mudanças na política administrativa mundial.
Che Guevara teve várias alcunhas. Enquanto jogador de futebol, era conhecido como Fuser, uma contração de "El Furibundo" e seu sobrenome materno "Serna" - por seu estilo agressivo de jogo. Para os companheiros de guerrilha, era apenas "el chancho", o porco, porque não gostava de banho.



Guerrilha e morte




Ele parte primeiramente para o Congo. Após o fracasso dos combates no Congo, parte para a Bolivia onde tenta estabelecer uma base guerrilheira para lutar pela unificação dos países da America Latina. Enfrenta dificuldades com o terreno desconhecido e em conquistar a confiança dos camponeses. É finalmente cercado e capturado em 8 de Outubro de 1967 e executado no dia seguinte pelo soldado boliviano Mário Terán, a mando do Coronel Zenteno Anaya, na aldeia de La Higuera. Os boatos que cercaram a execução de Che Guevara levantaram dúvidas sobre a identidade real do guerrilheiro, que utilizava documentos uruguaios falsos. A confusão estabelecida em torno do caso culminou no desaparecimento do seu corpo, que só foi encontrado trinta anos depois.
Em 1997 seus restos mortais foram encontrados por pesquisadores numa vala comum, junto a outras ossadas, na cidade de Vallegrande, a cerca de 50 Km de onde ocorreu a sua execucao. Suas ossadas estavam sem as mãos, que foram amputadas (para servir como troféu) logo após a sua morte. Seus restos mortais foram transferidos para Cuba.





IRONIAS
1-
A verdadeira morte
De Che Guevara
É
(tão pouca sorte)
Ser hoje vendido
Estampado em lucrativas
T-shirts capitalistas.

2-
A revolução
não é
a força do ideal.
É, em si mesma,
a morte do Ideal.


(D’aprés um poema de Maria Alexandre Dáskalos, A revolução/é)

NAMIBIANO FERREIRA

QUERO SER TAMBOR



Tambor está velho de gritar
Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
corpo e alma só tambor
só tambor gritando na noite quente dos trópicos.


Nem flor nascida no mato do desespero
Nem rio correndo para o mar do desespero
Nem zagaia temperada no lume vivo do desespero
Nem mesmo poesia forjada na dor rubra do desespero.


Nem nada!


Só tambor velho de gritar na lua cheia da minha terra
Só tambor de pele curtida ao sol da minha terra
Só tambor cavado nos troncos duros da minha terra.


Eu
Só tambor rebentando o silêncio amargo da Mafalala
Só tambor velho de sentar no batuque da minha terra
Só tambor perdido na escuridão da noite perdida.


Oh velho Deus dos homens
eu quero ser tambor
e nem rio
e nem flor
e nem zagaia por enquanto
e nem mesmo poesia.
Só tambor ecoando como a canção da força e da vida
Só tambor noite e dia
dia e noite só tambor
até à consumação da grande festa do batuque!
Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
só tambor!


José Craveirinha (Moçambique )

5 de outubro de 2007

ILHA



Deitada és uma ilha E raramente
surgem ilhas no mar tão alongadas
com tão prometedoras enseadas
um só bosque no meio florescente

promontórios a pique e de repente
na luz de duas gémeas madrugadas
o fulgor das colinas acordadas
o pasmo da planície adolescente

Deitada és uma ilha Que percorro
descobrindo-lhe as zonas mais sombrias
Mas nem sabes se grito por socorro

ou se te mostro só que me inebrias
Amiga amor amante amada eu morro
da vida que me dás todos os dias


David Mourão-Ferreira (Portugal)

OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO





Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.



Carlos Drummond de Andrade (Brasil)