24 de fevereiro de 2014

POEMA DE GOLGONA ANGHEL


Não me interessa o que
dizem os dissidentes da ditadura.
Mas confesso que gostava dos chocolates Toblerone
que a minha tia me trazia no Natal.
Não acredito nos detidos políticos,
nem me impressionam os miúdos descalços
que mostram os dentes para as máquinas Minolta
dos turistas italianos.
Não vou pedir asilo.
Desconheço os avanços
ou retrocessos económicos do meu país.
Já falei de Drácula que chegue.
Já apanhei morangos na Andaluzia.
Já fui cigana, já fui puta.
Escusam de mo perguntar outra vez.
O que me preocupa – e isso, sim, pode ser relevante
para o fim da história – é saber
quando é que me transformei,
eu que era uma loba solitária,
neste caniche de apartamento que vos fala agora?


Golgona Anghel (Roménia/Portugal)


Golgona Anghel nasceu na Roménia, em 1979, vive em Portugal, escrevendo poesia na  nossa língua portuguesa. 
Publicou: “Eis-me Acordado Muito Tempo Depois de Mim” - uma biografia de Al Berto (2006), “Crematório Sentimental - Guia de Bem-Querer” (2007) e "Vim Porque me Pagavam” (2011). A  editora Assírio & Alvim acaba de lançar “Como Uma Flor de Plástico na Montra de um Talho”. 

Um comentário:

António Eduardo Lico disse...

Uma bela poesia.
Obrigado por partilhar, não conhecia a autora.
Abraço.