3 de novembro de 2008

OS MEUS PÉS DESCALÇOS




Os meus pés andantes
Procuram a palanca real, palanca negra
E desencantam as quedas de Kalandula
Quedas da minha terra
Oh é bela Angola
É bela Angola e são felizes os meus pés caminhantes

Os meus pés empoeirados
Acariciam subsolo rico, ouro negro a jorrar no alto mar
Ouro negro a jorrar no offshore
E no onshore
Ouro negro a brotar
Das entranhas do mar, para os meus pés esfomeados!

Os meus pés garimpeiros
Apalpam tesouros e mais tesouros
Minas de diamante, ferro, cobre, prata, ouro…
Debaixo dos meus ásperos
Minas de diamante debaixo dos meus pés maltratados
Debaixo dos meus pés esfomeados

Os meus pés camponeses
Galgam a terra, terra boa de agricultura
Terra boa de verdura
E farta de feijão, mandioca, milho, batata…
Terra boa, terra farta
Debaixo dos meus pés famintos e felizes

Os meus pés pescadores
Banham-se em mares ricos
Mares de garoupas, corvinas, carapau, mariscos…
E mergulham em rios fartos, Kwanza, Kubango
Keve, Bengo…
Águas fartas a banharem os meus pés sofredores

Os meus bolsos vazios
Vêem outros bolsos vazios aterrar desnutridos
E depois, bolsos cheios
A levantarem voo, a embarcar abastados

Bolsos cheios a embarcar com sorrisos
A embarcar abarrotados, oh que paraíso!





Os meus pés descalços
Clamam por migalhas, clamam por pedaços
Os meus bolsos vazios
Não clamam por milhões, não clamam por rios
Os meus bolsos vazios e os meus pés famintos
Clamam somente por migalhas, de alimentos!




Décio Bettencourt Mateus, in Os Meus Pés Descalcos



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