A MÃO DO VENTO NA
SAVANA
Que voz perpassa
em teu dorso
quando
a noite
passos-de-onça
se aproxima?
Memória de areais
Negras falésias?
Se te escutando
paciente é o
trabalhar
de onda.
Eflúvios frémito
um deus muíla que
subisse
monandengue
só da raiz do
sangue.
João-Maria
Vilanova (Angola)
Sobre João-Maria Vilanova (texto retirado do site da
UEA-Uniao de Escritores Angolanos):
João Maria Vilanova, poeta da geração de 70, é um nome que esconde o maior
enigma da literatura angolana, um heterónimo que encobre muito bem o seu autor
biológico-histórico, continua fictício até hoje.
Na linha do pensamento teórico que vai de Stephane Mallarmé a Jonathan
Culler “interessa reflectir sobre a teoria da textualidade: a noção de que é a
palavra que constrói a realidade, e, portanto, é responsável pela criação
daquele espaço criador que é o autor. Nesta linha de pensamento, o autor
desaparece para dar lugar a palavras, cuja acção não só cria a obra, mas também
o próprio autor. Roland Barthes identifica esse fenómeno como o “espaço
discursivo de individuação” o qual estabelece certa unidade textual que nos
permite ultrapassar as contradições, nas quais se neutralizam os dados
biográficos (Barthes, Roland, «Roland Barthes par lui-même», Paris: Seuil
(1975)”, teorização desenvolvida pela ensíata Joanna Courteau (Ames), ler o
texto intitulado «D´A varanda do frangipani à morte dos heterónimos», in
Lusorama, nr. 50 (Juni 2002).
Jorge Macedo garante que conheceu o poeta quando esteve a trabalhar no
Kuanza Norte, ou seja, suspeita que tenha sido “um juiz branco que gostava da
poesia angolana, que conhecia as diversas propostas poéticas”. Muitos são os
escritores dessa geração que lançam suspeitas para todas as direcções.
Galadoardo em 1971 com o Prémio Mota Veiga, atribuído a «Vinte canções para
Ximinha», nunca apareceu para receber o merecido prémio. Mas não deixou de
aparecer, em 1974, através da revista Ngoma, mantendo-se na mesma no meio de
uma «grande nuvem». Em 1974, edita «Cadernos de um guerrilheiro».
João - Maria Vilanova é um poeta que usa o bilinguismo como seu recurso de
escrita e por ser assim “marcadamente bilinguista, regionalista, vanguardista,
intraduzível, e, portanto, inequivocamente pré-angolana, a poesia de João
Vilanova paga o preço do desconhecimento mundial, enquanto a poesia de
Agostinho Neto, retórica, grandiloquente, alegórica, aristotélica, aspirante ao
universalismo, aufere fama de múltiplas traduções. Vilanova realiza na poesia
algo como José Luandino Vieira na prosa: retira à História da Literatura
Portuguesa poder de anexação”, são palavras do crítico Pires Laranjeira.
O ensaísta vai mais longe na sua análise estrutural quando afirma que “Não
há recorrência ao empolamento do metaforismo e da ruptura abrupta da ritmia do
discurso, como seria usual nas concepções poéticas latino-europeias. As
rupturas e empolamentos situam-se em níveis do discurso diferentes da
literatura portuguesa. A inovação é, por isso, de sinal radicalmente
anticolonialista. O discurso não pode ser apropriado pelas instâncias
colonialistas por se inscrever nos antípodas da sua boa consciência. A forma
dialógica é também inalienável da condição de herdeiro da estrutura da
narrativa bantu.”.
Pires Laranjeira não deixa de realçar na sua crítica o apuramento
estilístico de Vinanova que foge do discurso directo: “A denúncia do
paternalismo, como de outras sequelas do colonialismo, quase nunca se faz em
linguagem expositiva, panfletária. A força, o propósito do discurso poético não
é do mesmo género do discurso político.”
Os quimbos quietos pensados no silêncio (...) Da Envagélica os cânticos se
derramando na voz do vento: povo
Excerto de um poema in Vinte Canções para Ximinha.
Para o professor Manuel Ferreira, o poeta anónimo "será o que mais
conscientemente prolonga e renova as experiências dos poetas da Mensagem e da
Cultura (II). Tudo leva a crer que Vilanova venha dos tempos da Mensagem,
notadamente quando o seu enunciado é a expressão de um certo quotidiano povoado
de rememorações; nelas e na narração evocativa um mundo de anseios e suspensões
significativas nos povoa a imaginação".
Ainda segundo Manuel Ferreira, em Caderno de um guerrilheiro, o poeta elege
como temática "o povo angolano crescendo na luta armada." e
considera-o como o poeta do "rigor e da elaborada interiorização da gesta
do povo angolano, com uma fala para cada tema, uma gramática pessoal na fusão
de níveis e áreas linguísticas, mesmo quando o real é momentâneo e no seu verbo
se trtansfigura e dimensiona".
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