29 de julho de 2012

OLHOS MÍSTICOS

Místicos olhos percorrem
as ladeiras encrustadas
de limbos na minha alma.
São pérolas negras, veias, sedas
aveludadas de escarlate carmim.
E nos rosários de cordas formam-se
nós excêntricas obras,
talismãs de marfim, onde
as feras despidas de modas
amordaçam meu corpo,
a terra em trovas e resgatam
meu estro por fim.


Dinah Raphaellus (Portugal)

http://poesialilazcarmim.blogspot.co.uk/

28 de julho de 2012

Alucinação

 
 
 
choram os murilaondes

o sangue dos homens

vertido inutilmente…

a língua bifurcada

dos iniciados

é tocada

com o dente da serpente

e os tambores gemem

na profundeza verde-escura

da selva

a palavra maldita:

- cálua, cálua, cálua!!!

a lua,

mutunga brilhante

no olundongo

entoado pelas nuvens,

semeia sombras confusas

de comedores-de-almas

espalhando-se pela terra…

dos eumbos

elevam-se gritos de dor…

no mato,

as hienas dançam

ao som ritual

das mbulumbumbas

e os seus olhos

chispando fogo

são corações humanos

transformados em brasas…

(a floresta retorce-se toda

num esgar de sofrimento)

e, de longe,

no ribombar dos trovões,

os tambores gargalhantes

dos ngngas…

nos eumbos,

a seiva vermelha

alucinada

banha os olhos dos homens…

… o irmão mata o seu irmão!...



Jorge Arrimar (Angola)

4 de julho de 2012

Poema de Graça Magalhães

Flor do cajueiro



6.
 
Do lugar onde nasci
crescem flores de caju
prometem-se aos olhos
a caligrafia das paisagens
o movimento dos rios
a simples constelação das flores
em torno dos caules

São como traços de rubi os animais
satélites gráficos voadores
sobre ramos genuflexos
iluminando as noites mal fechadas

eu era pequena
trouxe a memória ocre das falésias
um rapaz ostra dentro do peito
as rosas de açafrão despindo as saias

Graça Magalhães, in A Geografia do Tempo, Palimage ed. (
Portugal)